quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

MELLO, Luiz Gonzaga de. "História da Antropologia"

 

MELLO, Luiz Gonzaga de. Antropologia cultural: iniciação, teoria e temas. 15a. ed. Petrópolis: Vozes, 2008, p, 177-197.

 

                História da Antropologia

 

                Nosso objetivo ao estudar a história da antropologia é mostrar como esta disciplina se desenvolveu ao longo do tempo, até chegar até nós. O conhecimento dos fatos históricos do passado da antropologia podem nos ajudar a entender a “utilidade” desta ciência. A finalidade de conhecer o histórico da antropologia é ajudar a compreender o seu alcance

                Mello (2008, p. 178), seguindo a divisão de Pareto, apresenta os níveis sob os quais o estudo da antropologia é feito: 1 - o aspecto objetivo: busca saber a consistência das orientações teóricas empregadas na antropologia e se o método usado é legítimo; 2 - o aspecto subjetivo: os motivos que levam os autores a fazer escolhas por teorias e seu êxito ou fracasso; e 3 - o aspecto da utilidade: a orientação teórica que nos permite perceber a aplicação da antropologia em outras dimensões de nosso cotidiano.

                Mello irá contar a história da antropologia dividida em quatro momentos, seguindo a divisão de T. K. Penniman: período de formação (...-1835), período de convergência (1835-1869), período de construção (1869-1900) e período de crítica (1900-...). É importante saber que a antropologia, como as outras ciências, não tem data exata de nascimento: “A ciência não nasce de um dia para o outro. Trata-se de um processo lento que implica em criação, acumulação e reformulação de conhecimentos” (MELLO 2008, p. 179). Heródoto (480 ou 425-499 a.C.) [sic], Edward B. Tylor (1832-1917) ou Friederich Blumenbach (1752-1842), Boas ou Malinowski, podem ser apontados como pais da antropologia, sob diferentes aspectos.

 

                Período de formação (... - 1835)

 

                Este momento pode ser traçado desde a primitividade humana até os primeiros trinta anos do século XIX. A discussão vai desde a pré-história da humanidade até as elaboradas teorias sobre a evolução humana do final do primeiro milênio da humanidade ocidental.

                O período do estudo da pré-história da humanidade corresponde ao estudo dos primeiros hominídeos, sua relação com o mundo, sua capacidade de organização social, seus instrumentos de trabalho e caça e o aprendizado que eles nos legaram como herança. Parte do que somos hoje é resultado da sobrevivência de nossos ancestrais. O domínio da agricultura, por exemplo, foi fundamental para a sobrevivência dos povos antigos, assim como é fundamental para nós até hoje.

                Um dos relatos mais antigos sobre a curiosidade humana em saber sua origem é a experiência encomendada pelo príncipe egípcio Psamético. Heródoto narra esta experiência: duas crianças, uma egípcia e outra frígia, são cuidadas por um pastor isoladas do grupo e no silêncio, para ver qual a palavra original a ser pronunciada; e a palavra foi becos, que em frígio, e não em egípcio, quer dizer pão. A tentativa era saber quem era o povo mais antigo. E o resultado não alegrou Psamético. Outras contribuições foram a divisão de Lucrécio: idade da pedra, do bronze e do ferro; as investigações no terreno da filosofia e teologia de Agostinho, Averróis, Bacon, e Avicena, um dos fundadores da medicina moderna.

                A mudança do paradigma teocêntrico para o antropocêntrico também é marcante neste período, juntamente com a invenção da imprensa tipográfica de Gutemberg (1455), o que, juntamente com a navegação, permitiu o aumento da transmissão de informações. Este é um período no qual o homem se sente senhor da sua história e começa a andar por novos caminhos, que desembocarão no Iluminismo e na ciência moderna.

                Vamos ter o grande desenvolvimento da antropologia cultural, a sistematização da antropologia física, o surgimento da pré-história e da arqueologia. A expansão marítima européia do séc. XVI trouxe à tona a presença de outros povos e os missionários e conquistadores produziram fartos relatórios sobre outros “homens” (aborígines; teoria monogenista, de que o homem teria uma origem única, é posta em dúvida). Algumas viagens marítimas também eram aproveitadas para levar pessoas para coletar dados etnográficos sobre os novos povos, a fim de juntar informações para as pesquisas dos antropólogos europeus.

                Este período ainda é marcado pelos estudos da anatomia humana e pelos achados mais antigos dos fósseis humanos.

 

 

                Período de Convergência (1835-1869)

 

                Este período é marcado pela discussão do problema da evolução da humanidade. Boucher Perthes (1838) é o primeiro a propor esta questão. Boas (1896) irá fazer uma crítica ao evolucionismo, propondo a busca de métodos mais realistas e seguros na abordagem dos fatos sócio-culturais. Vão surgir neste período várias revistas e associações de antropologia. E serão definidos, por exemplo, os conceitos de sociedade e cultura. Os antropólogos vão passar a ser vistos como “amigos” dos povos primitivos, porque eles lutaram contra a expansão predatória européia que colocava em risco a vida dos grupos primitivos, seu objeto de estudo.

 

                Período de construção (1869-1900)

 

                O marco importante deste período é Charles Darwin (1859) “Origens das espécies”, obra clássica sobre a evolução biológica das espécies. Considerado como fundador da moderna antropologia, temos Edward Tylor, também evolucionista.

                Outros nomes importantes deste período: “...Batian, com sua teoria das ideias elementares; Bachofen, jurista suiço, que estudou a mitologia clássica e defendeu uma evolução na organização social que, segundo ele, logo após o regime de promiscuidade teria existido o matriarcado, uma espécie de ginogracia; Sumner Maine, também jurista, via na família patriarcal a unidade básica da organização social; McLennan desenvolveu a noção de paralelismo e procurou interpretar vários costumes primitivos; Edward Tylor, citado acima, é o nome mais importante para a antropologia cultural, porquanto foi ele que definiu o termo ‘cultura’ e apresentou-a como objeto da antropologia, estudou o fenômeno religioso, mas dedicou-se a todo o objeto da antropologia dando-lhe uma sistematização tanto no seu objeto como no seu método:[sic] Lewis Morgan também merece realce. É dele o clássico esquema da evolução cultural (selvageria, barbárie e civilização); igualmente muito importante é o nome de Frazer, que também se dedicou ao estudo do fenômeno religioso” (MELLO, 2008, p. 193).

 

                Período de crítica (1900-...)

 

                O período de crítica vem desde 1900 até hoje: crítica aos cânones iniciais da antropologia, novas abordagens, avanço das ciências afins, os meios de comunicação permitiram maior divulgação de ideias, democratização da educação, crescimento do movimento universitário, antropologia inserida em muitos currículos (Univ. Liverpool: introdução da primeira cátedra de antropologia social na Grã-Bretanha). A antropologia assume um novo papel diante da necessidade de se entender não somente o homem primitivo ou as tribos isoladas em outros continentes. A necessidade agora é entender quem é o homem contemporâneo, seu comportamento e modo de vida. A antropologia divide esta tarefa juntamente com outras ciências humanas.

                Ainda no início do séc. XX temia-se que o desaparecimento dos povos primitivos levasse consigo a antropologia. Mas o que ocorreu foi a mudança metodológica: do imperialismo e colonialismo europeu para o nacionalismo africano, latino-americano: a antropologia se votou ao estudo do homem atual. Mello (2008, p. 195) diz que a “preocupação com o desaparecimento dos povos primitivos levou uma parcela dos estudiosos a se emprenhar numa tarefa, aparentemente de menor importância, de coletar e registrar dados sem uma maior preocupação teórica. Esse trabalho é conhecido com etnografia - a descrição dos costumes dos povos”.

                Nos EUA a antropologia vai ser marcada por uma forte influência da psicologia. Na Europa a pesquisa de campo se consolida como um método fundamental para a formação do antropólogo. Nomes importantes deste momento vão ser: Malinowski - funcionalismo; Radclife-Brown, funcionalismo, criador do estruturalismo inglês; Lévi-Strauss, estruturalismo, marcado por uma teoria bem formulada, mas deficiente na metodologia de pesquisa de campo.

                Nos países de Terceiro Mundo o que se espera é o reflorescimento dos estudos sobre a aculturação, que desemboque no surgimento da antropologia urbana, da cultura de massa, da cultura popular, do folclore e dos efeitos da urbanização doentia sobre as manifestações dessa cultura.

 

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