Apresentação
Este
texto é um pequeno esforço de entendimento da obra de Ciro Marcondes Filho, Televisão:
a vida pelo vídeo para o aproveitamento do módulo de “Teorias da Comunicação”
do SEPAC.
A
obra de Ciro Marcondes apresenta o fenômeno da TV na vida do cotidiano das
pessoas abordando não o meio em si, mas toda a gama de questões que se põem na
relação do meio com o receptor.
Esta
sua análise encontra, assim, grande valor na medida em que aponta os fatos de maneira
clara e concisa evidencia as razões e a natureza de muitas dúvidas e realidades
que existem entre o meio e o indivíduo.
Síntese do conteúdo do livro
Introdução
Por
que o homem moderno precisa tanto da TV?
Esta
é a pergunta chave deste trabalho de Ciro Marcondes Filho, que dá movimento a
toda sua reflexão desenvolvida neste livro.
Basicamente
a televisão, como coloca o autor, atende a necessidade muito antigas do homem,
ligadas ao se “mundo de fantasias” que move, com suas aspirações, o “mundo das
obrigações”.
A eletronização dos sonhos
A
TV, como apresenta Filho, está dentro da casa de cada indivíduo para preencher
também uma lacuna nas suas relações interpessoais. A TV estabelece uma nova
forma de diálogo com o indivíduo fazendo distanciar-se, no isolamento, das
inúmeras possibilidades de contato com as outras pessoas.
A
história da imagem, que ganhou seu papel principal na TV, é-nos mostra de como
o homem foi aos poucos estabelecendo contato com o real , e construindo seu
imaginário, de maneira representativo-simbólica entre sua própria ação e sua
realidade circunstante. Desde as primeiras pinturas, a fotografia até os meios eletrônico-digitais
de hoje o homem vem estabelecendo uma relação sempre nova com seu mundo via
imagem.
Isso
fez com que o meio que prevalecesse em todo processo de relação fosse tão só e
justamente a TV. Ela estabelece um espaço de comunicação entre homem, real,
imaginário e seduz o telespectador de forma a fazer-se parte integrante de sua
vida.
A
TV, na sua mais audaciosa pretensão, pode exercer um papel de “domesticadora da
fantasia”. No estabelecimento de diálogo entre o real e o imaginário circunstante
do indivíduo ela apresenta o real, enquanto produto cultural, de maneira
industrializada, como que uma manufaturação de uma matéria-prima qualquer. O
fato particular é posto em evidência assumindo caráter e características universais
e válidas, o que o torna “facilmente consumível” (FILHO, 1988, p. 31) e já não
mais pertencente a ninguém, a nenhum grupo ou cultura.
Fascínio, modelos e linguagem da TV
A
TV se põe na vida, no cotidiano das pessoas, como um meio fascinante. Desde a
sua invenção e sua chegada ao Brasil, ela tinha o poder de congregar os
“televizinhos” na casa daqueles que possuíam o aparelho.
Hoje
o fascínio que a TC exerce na massa não congregar mais as pessoas em torno de um
aparelho, visto que “todo mundo” já tem seu aparelho, mas congrega o imaginário
de todos, a fantasia de todos.
O
fascínio que a TV gera no telespectador passa pelo modo com o qual os seus
programas são apresentados. Tudo o que a televisão exibe tem uma característica
muito peculiar, com vista em prender a atenção do outro lado da “telinha”: o
caráter de espetáculo, de show, que reveste todo seu produto.
A
TV trabalha de tal maneira a sua própria linguagem, que passa pela “cultura do
passado e do desenvolvimento das outras formas de comunicação social” (FILHO,
1988, p. 43), para tornar o “diálogo” entre o meio e o receptor cada vez mais
possível de compreensão, na medida em que este responda ao que ela apresenta, seja
no consumo, na reflexão, no comportamento, nos sentimentos... na audiência.
A
TV se serve ainda de signos que atuam em dois planos: a cabeça do receptor como
mecanismo de defesa do ego na negação da realidade e no produto, “pois o
produto e realizado por pessoas que também elaboram os pensamentos como signos”
(FILHO, 1988, p. 45). O signo exerce uma função que, basicamente, se explica
pelo desligamento emocional do telespectador frente ao que se exibe na TV.
O
clichê também é outro mecanismo usado na TV. Sua função é estabelecer uma fusão
entre o emocional do telespectador diante da exibição televisiva. O clichê
distingue-se por esta sua capacidade de estabelecer uma ligação entre os
sentimentos apresentados na TV e os sentimentos e emoções do telespectador, que
estão gravados no seu inconsciente, referentes a emoções fortes de sua vida.
Os gêneros da TV
A
televisão compõe-se de muitos gêneros responsáveis de estabelecer a relação
meio-receptor de uma maneira mais variada, criativa e atraente.
Os
telejornais veiculam notícias de tal forma a somente colocá-las diante do telespectador
sem nenhum compromisso de informação-formação. O telejornal representa mais um
modo de amenizar o negativo do real e propondo uma lado positivo da realidade
de maneira a satisfazer o ego do espectador.
As
telenovelas trabalham muito mais com a afirmação de modelos comportamentais e
possibilidades de realização, a fim de fazer o espectador entrar em contato com
um mundo social, do que com a fomentação ideológica manipuladora do telespectador.
Na
TV, o humor exerce um papel fundamental de, segundo Freud, provocar o afrouxamento
de nosso controles internos e satisfazer, no caso do humor malicioso, nossas
pulsões representadas e proibidas. O humor encarna em si a irreverência de
poder debochar do discurso sério, “pois o discurso sério na sociedade não
passa, de fato, de puro deboche” (FILHO, 1988, p. 47).
Existem
ainda, os programas de entrevistas com auditório que representam, de uma maneira
eletrônico-televisiva, o que a realidade do circo traz na sua essência:
oferecer ao “respeitável público” o que há de espetacular, espantoso,
fantástico; tudo isso de forma bem familiarizada com a realidade do
telespectador, como que entrando na sua sala de estar, uma vez que este pode fazer
parte do auditório-picadeiro ou, ao menos, sentir-se mais um na plateia comendo
pipoca ...
Os
programas de gênero esportivo, na TV, encerram em si uma característica muito
peculiar, mas não muito notória: a possibilidade de que a população humilde e
simples tem de sublimar suas frustrações, no caso do futebol, dos homens em
particular.
Os
musicais trazem na sua forma uma realidade importante para a efetivação de todo
o processo de atenção: o som desempenha um papel de “valores modais de
fantasia” (FILHO, 1988, p. 73). Eles trabalham com temas simples e populares,
de fácil fixação, que, através da repetitividade, alcançam seu lugar cativo na
mente do telespectador-ouvinte. Nos musicais, cenários, artistas,
apresentadores etc., além de apresentarem um realidade rítmica de movimento,
estão sempre preocupados com a manutenção de novos padrões de apresentação de
sua imagem como um todo. Isto torna o musical, o cantor, atraente por um tempo
maior, na medida em que estes se livram do enquadramento cristalizador de um
modelo feito pelo público.
O
videoclipe é uma nova maneira de se trabalhar, a partir da conjugação de imagem-enredo-melodia
musical, as emoções fantasiadas do produto. Contudo, a sua novidade de já mostrar
a fantasia que estava escondida por detrás da canção inibe o telespectador de
construir ele mesmo o cenário de fundo da música.
A
publicidade na TV está mais além do que somente vender produtos, ela dá “a
demonstração de modelos a serem seguidos” (FILHO, 1988, p. 77), a partir do
estabelecimento de um padrão estético altamente perfeito e belo.
Dentro
das propagandas, aquela que se chama “propaganda subliminar”, hoje, já não encontra
mais razões comprovadas de poder se dar como verdadeira e de chegar a seu
termo.
Televisão e sociedade
A
TV encontra nos diversos seguimentos e dimensões da sociedade um tipo de
ressonância diferente.
No
campo da ideologia a TV confirma, mais que altera, a opinião geral do público
sobre a norma e a ordem geral instituída da sociedade. Tem-se a ilusão de que a
TV distancia o espectador da realidade, contudo, como afirma Goodlad, a assistência
dos programas populares é “um ritual social de integração, através do qual
brincamos de suprimir os valores vigentes e os modos de comportamento, mas que,
no fim, recebemos uma cacetada moral que nos faz voltar ao mundo do direito e
da ordem, pois os problemas são sempre resolvidos e os espectadores tem a
sensação de que tudo volta ao seu ritmo normal” (FILHO, 1988, p. 83).
A
relação da TV com a política não é, o contrário do que geralmente se pensa,
determinístico-manipuladora. É um mito dos jornalistas afirmar que é a
televisão que determina posturas políticas ou elege determinado candidato. A
massa não é inteiramente passiva e irracional e o mecanismo televisivo ou
qualquer outro grande meio de comunicação não age sozinho, sem ter ideologias,
poderes, pessoas por trás de si.
Quanto
à reprodução da violência é falsa a afirmação de que a TV gera violência. Ela é
somente um canal de expressão, via pela qual o impulso contido no imaginário
individual e coletivo dos telespectadores encontra modo de extravasamento. O
comportamento violento só se efetua quando “a TV legitima uma ação primitiva
extralegal” (FILHO, 1988, p. 89), radicada na sua “função exemplar”.
A
opinião pública também não é inteiramente constituída pela TV. Existem outras
fatores que colaboram, mais discretamente, na formação da opinião da massa. É
de fundamental relevância a história individual das pessoas que contêm fatos e
acontecimentos que, antes dos meios de comunicação, constroem a opinião de cada
um. Há que se considerar também o tempo histórico vivido a cada época.
A
censura, como apresenta Filho, explica-se como “controle ostensivo... uma forma
aberta de repressão” (FILHO, 1988, p. 96) que se dá numa esfera de autocensura,
censura externa pública e privada, encabeçada pelas diversas instituições
“legisladoras” da sociedade. O erotismo é apresentado como ritual, mecanização
e caricatura representacional do prazer. É a simulação da possibilidade de realização
do desejo sexual, que passa, no homem e na mulher, pelas regras psíquicas do
complexo de Édipo e de castração.
Ao
abordas a relação da TV e educação o autor analisa a questão de uma maneira
mais real e otimista: a TV não veio competir com o educador; cabe a este
reaprender uma maneira nova de ensinar __ e aqui a TV pode ajudá-lo __ conhecendo
e entendendo os mecanismos/linguagem que a TV usa para se fazer tão “atrativa”.
Quanto
à questão da TV e da criança, o que de mais concretamente de pode dizer, fugindo
das errôneas colocações do senso comum e considerando a grande assistência das
crianças à TV, é que o assistir televisão pode levar:
-
a uma atividade mental passiva;
-
incentivar a preferência pela vida “fabricada” à própria vida;
-
desconfigurar a iniciativa própria, enquanto mero espectador;
-
incapacitar a criança a emoções autênticas;
Como reagir diante de TV
Reagir
diante da TV não significa aniquilá-la, desligá-la em constante protesto. Antes
de mais nada, é necessário reconhecer tudo o que se esconde atrás de um
aparelho eletrônico como a TV.
A
TV possibilita a passagem do nosso mundo privado ao mundo da fantasia, o que
altera a relação do homem com o mundo.
A
tecnologia desenvolvida nos últimos tempos, sobretudo com relação à televisão,
não põe o aparelho em condição de inteiramente prejudicial, mas, por isso, nem
totalmente ruim. Esta tecnologia afeta a todos e ocasiona mudanças de hábitos,
procedimentos, mentalidade.
Segundo
M. A. Erausquin, se não se pode lutar contra a qualidade na TV, resta reduzir o
tempo em que a ela nós dedicamos na assistência, pois o interesse mercadológico
tem a necessidade de público fixo (pessoas, horário) o que tolhe a liberdade de
escolha de programação do telespectador a partir de sua iniciativa de assistir
a TV acriticamente.
Relação do livro com o módulo de “Teorias da Comunicação”
A
relação do conteúdo do livro com o módulo “Teorias da Comunicação” pode se dar
com referência às colocações sobre o pensamento de Gramsci “Cultura e hegemonia
em Comunicação” e “Psicanálise em Comunicação”.
Quanto
ao pensamento de Gramsci, os conceitos de hegemonia, cultura popular, aparelho
ideológico, a análise de Ciro Marcondes da TV mostra que ela pode atuar não
como determinadora de um posicionamento político-social, mas com uma função
reforçadora de tendências que partem de um projeto de “dominação” hegemônica
não pertencente diretamente à ela, mas aos seus anunciantes, aos empresários,
posições políticas e uma determinada ideologia a ser sustentada e afirmada como
tal.
Quanto
à cultura popular a TV nem sempre é espaço aberto para este tipo de expressão,
uma vez que ela __ a TV __ neutraliza os fatos que apresenta em sua “telinha”
traduzindo-os numa linguagem básica, conferindo-lhes valores mercadológicos e
destituindo-os de seu “lugar originário”.
Quanto
à “Psicanálise em Comunicação” por várias vezes temos no livro referências não
só a Freud mas às diversas teorias da psicanálise. Entre elas é muito notória a
citação do complexo de Édipo e de castração, a relação narcisista diante do
meio, a troca de possibilidades entre imaginário e programa exibido, fantasia e
mundo real...
As
teorias psicanalíticas, sem dúvida, são de estrema importância na análise e
compreensão dos mecanismos da TV, bem como da sua realçado com os indivíduos.
Conclusão crítica sobre o livro
A
análise do autor é de uma seriedade interessante. Ao abordar o tema da TV, como
um todo, ele procura estabelecer parâmetros de análise que não são unilaterais.
TV e receptor são analisados ora juntos, ora separadamente. Este não é melhor
do que aquele e vice-versa.
O
livro trata da questão de maneira didática e num linguajar bem acessível. A explicitação
dos temas a cada capítulo proporcionam uma fácil localização para o leitor de
cada assunto.
A
seriedade do livro é também percebida na constante citação de autores diversos
e variados trabalhos e pesquisas. Isto alerta que a complexidade do fenômeno TV
não pode ser simploriamente abordada.
O
ponto mais interessante, no decorrer do livro, foi a abordagem da TV com
relação ao problema da educação. Antes de apontar soluções para resolver o embate
professor x TV na disputa pela assistência do aluno, a dica do autor é, antes
de tudo, que o professor reconsidere a sua maneira tradicional de dar aula e vá
aprender com a TV quais os mecanismos, qual a linguagem usada para ter tantos
pontos no IBOPE. E alerta: não se trata de eletronizar o professor, mas sim de
se servir da “imagem e som”, que é a TV, para aprimorar seu método docente e
acompanhar os tempos estando em sintonia com a geração sempre jovem que são
seus alunos.
Referência
FILHO,
C. M. Televisão: a vida pelo vídeo. São Paulo: Moderna, 1988.
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