segunda-feira, 15 de abril de 2024

LAPLANTINE, François. Aprender antropologia - Cap. 2 - Part 1 - O século XVIII: a invenção do conceito de homem

 

LAPLANTINE

Área: antropologia

Tema(s): história da antropologia; século XVIII e desenvolvimento do conceito de homem

 

LAPLANTINE, François. Aprender antropologia. Tradução Marie-Agnès Chauvel; prefácio Maria Isaura Pereira de Queiroz. São Paulo: Brasiliense, 2007, p. 54-62. (Clefs pour L’antrhopologie 1988) (Cap. 2 - Part 1 - O século XVIII: a invenção do conceito de homem)

 

 

p. 54

- durante o Renascimento temos um esboço da interrogação sobre a existência múltipla do homem sobre o globo

- no século seguinte o que se dá é a redução ao cogito e serão excluídos “...da razão o louco, a criança, o selvagem, enquanto figuras da anormalidade”.

- [a estrutura cartesiana sujeito-objeto vai pôr em questão a existência de um sujeito autônomo diante do mundo e que precisa apoiar-se num método científico confiável para conhecer e dominar a natureza]

p. 55

- Foucault - As palavras e as coisas - apresenta a ideia de que o homem não existia antes do final do século XVIII, sua criação é recente - “O homem é uma invenção e a arqueologia de nosso pensamento mostra o quanto é recente.’

- “O projeto antropológico (e não a realização da antropologia como a entendemos hoje) supõe:

   1) a construção de um certo número de conceitos, começando pelo próprio conceito de homem, não apenas enquanto sujeito, mas enquanto objeto do saber;

   2) a constituição de um saber que não seja apenas de reflexão, e sim de observação, isto é, de um novo modo de acesso ao homem, que passa a ser considerado em sua existência concreta, envolvida nas determinações de seu organismo, de suas relações de produção, de sua linguagem, de suas instituições, de seus comportamentos.”

p. 56

   “3) uma problemática essencial: a da diferença. Rompendo com a cosmovisão de uma transparência imediata do cogito, coloca-se pela primeira vez no século XVIII a questão da relação ao impensado, bem como a dos possíveis processos de reapropriação dos nossos condicionamentos fisiológicos, das nossas relações de produção, dos nossos sistema (sic) de organização social.”

- a linguagem se apresenta com precedente ao homem, pois ele é exterior a ela; tal concepção era inimaginável antes; “A sociedade do século XVIII vive uma crise de identidade do humanismo e da consciência européia.”

p. 57

   “4) um método de observação e análise: o método indutivo. Os grupos sociais (que começam a ser comparados a organismos vivos, podem ser considerados como sistemas ‘naturais’ que devem ser estudados empiricamente, a partir da observação de fatos, a fim de extrair princípios gerais, que hoje chamaríamos de leis.”

- “Esse projeto de um conhecimento positivo do homem - isto é, de um estudo de sua existência empírica considerada por sua vez como objeto do saber - constitui um evento considerável na história da humanidade.” - este evento se tornou constitutivo da modernidade;

- as bases da ruptura com o humanismo do Renascimento e com o racionalismo do século clássico podem ser traçadas desde o século XVI;

p. 58

   “1) Trata-se em primeiro lugar da natureza dos objetos observados. Os relatos dos viajantes dos séculos XVI e XVII eram mais uma busca cosmográfica do que uma pesquisa etnográfica.” - os relatos desses viajantes poucas vezes eram sobre “inclinações” e “costumes” dos povos; no mais das vezes relatavam sobre o céu, a terra, fauna e flora, e quando se falava do homem, as descrições eram do homem físico;

   “2) Simultaneamente, o destaque se desloca pouco a pouco do objeto de estudo para a atividade epistemológica, que se torna cada vez mais organizada. Os viajantes dos séculos XVI e XVII coletavam ‘curiosidades’. Espíritos curiosos reuniam coleções que iam formar os famosos ‘gabinetes de curiosidades’, ancestrais dos nossos museus contemporâneos”. - a preocupação no século XVIII é como coletar e como dominar o que foi coletado, pois há um crescente acúmulo de informação que precisa ser sistematizada, interpretada e elaborada; a esta atividade se chamará de etnologia;

p. 59

- no século XVIII também se forma o par do viajante e do filósofo: o observador que recorre os quatro cantos do mundo e o pesquisador incumbido da tarefa de análise e síntese; embora esta parceria seja promissora, mas nem sempre livre de conflitos (Bougainville e Rousseau têm um confronto);

- “Para o primeiro, bem como para todos os filósofos naturalistas do século das luzes, se é essesncial observar, é preciso ainda que a observação seja esclarecida: Uma prioridade é portanto conferida ao observador, sujeito que, para aprender corretamente seu objeto, deve possuir um certo número de qualidades”. - temos o surgimento da Sociedade dos Observadores do Homem (1799-1805), cujos membros eram chamados “ideólogos” e eram moralistas, filósofos, naturalistas, médicos, que têm por objetivo estudar “...(o homem nos seus aspectos

p. 60

físicos, psíquicos, sociais, culturais)...”

p. 61

- obstáculos para o surgimento de uma antropologia científica:

   “1) A distinção entre o saber científico e o saber filosófico, mesmo senta abordada, não é de forma alguma realizada. Evidentemente, o conceito da unidade e universalidade do homem, que é pela primeira vez claramente afirmado, coloca as condições de produção de um novo saber sobre o homem.”

- há questionamentos acerca da natureza, da produção e repartição das riquezas, sobre o discurso, mas não se ainda dos saberes da biologia, economia, filosofia ou linguística;

-  “O conceito de homem tal como é utilizado no ‘século das luzes’ permanece ainda muito abstrato, isto é, rigorosamente filosófico. Estamos na impossibilidade de imaginar o que consideramos hoje como as próprias condições epistemológicas da pesquisa antropológica. De fato, para esta, o objeto de observação não é o ‘homem’, e sim indivíduos que pertencem a uma época e a uma cultura, e o sujeito que observa não é de forma alguma o sujeito da antropologia filosófica, e sim um outro indivíduo que pertence ele próprio a uma época e a uma cultura.”

p. 62

   “2) O discurso antropológico do século XVIII é inseparável do discurso histórico desse período, isto é, de sua concepção de uma história natural, liberada da teologia e animando a marcha das sociedades no caminho de um progresso universal.” - caberá ao evolucionismo, mesmo sendo historicista, dar o passo de emancipação a este contexto.

 

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