domingo, 14 de janeiro de 2018

ALGUMAS DIFERENÇAS GRAMATICAIS ENTRE A LÍNGUA PORTUGUESA E A LIBRAS[1]


APRESENTAÇÃO


Neste texto apresentamos uma breve reflexão de algumas das diferenças entre a Língua Portuguesa e a Língua Brasileira de Sinais.

Ao comparar alguns elementos constitutivos destas duas línguas podemos perceber a riqueza de cada uma delas e como ambas se instrumentalizam para alcançar o objetivo de dizer o mundo e inserir o falante dentro dele.

Para os indivíduos que falam línguas diferentes, a experiência de aprender a se comunicar na língua do outro é garantia não só de aprender uma nova forma de ver o mundo, mas também uma nova forma de se manifestar no mundo e de enriquecer a própria forma de uso e comunicação em sua língua materna.



1 QUADRO COMPARATIVO: LÍNGUA PORTUGUESA E LIBRAS


Quadro com as principais diferenças entre a estrutura da Língua Portuguesa e da Libras:

Características
Língua Portuguesa
Libras
FONOLOGIA

- Elementos mínimos: fonemas.










- Pode ser verbal, não verbal, visual, auditiva.






- Elementos mínimos processados linearmente, horizontalmente e no tempo (PEDROSO; ROCHA, 2013, pp. 165-166).

- Unidades mínimas:
1) Configuração de mãos (CM).
2) Ponto de articulação (PA) ou localização da mão.
3) Movimento (M).
4) Orientação da mão (OR).
5) Aspectos não manuais dos sinais (NM) – expressões fa­ciais e corporais. (PEDROSO; ROCHA, 2013, pp. 165-166).

- As línguas de sinais são visual-espaciais (ou espaço-visu­al), pois a informação linguística é recebida pelos olhos e produzida pelas mãos. (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 166).

- Os elementos mínimos constituintes da língua de sinais são processados simultaneamente e não linearmente como ocorre na língua oral. (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 166).

MORFOLOGIA

- Elementos próprios: entonação vocal, expressão facial, expressão corpo­ral, recursos não verbais, elementos performáticos (humor, sarcasmo, etc.).





- Nas línguas orais, as palavras complexas são, muitas vezes, for­madas pela adição de um prefixo ou sufixo a uma raiz. Já nas línguas de sinais, essas formas resultam, frequentemente, de processos não concatenativos, em que uma raiz é enriquecida com vários movimen­tos e contornos no espaço de sinalização (KLIMA; BELLUGI, 1979), como por exemplo, os sinais "árvore" e "paquerar" (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 176).


- As línguas de sinais, como línguas visual-espaciais, apresen­tam elementos próprios, como expressão facial, expressão corpo­ral, movimento, velocidade e direção, que, incorporados ao sinal, garantem a mesma riqueza de expressão que as línguas orais (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 163).

- Alguns morfemas, por si sós, constituem palavras, outros nunca formam palavras, apenas constituem partes delas. Nesse caso, temos os morfemas presos, que são os sufixos e os prefixos, uma vez que não podem ocorrer isoladamente. Têm-se, também, os morfemas livres que constituem palavras (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 175).
SINTAXE

- Sintaxe predominante de ordem direta: sujeito + verbo + complemento.

- Vejamos um exemplo: em português sinalizado, ou seja, uti­lizando-se os sinais na estrutura da Língua Portuguesa, se diz: "Eu comi pizza ontem.", com quatro sinais – um sinal para cada palavra e nessa sequência. Em Libras, a mesma ideia é expressa da seguin­te maneira: "Pizza comi ontem", com três sinais e nessa sequência (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 160).

LÉXICO

- Léxico baseado numa língua raiz e em empréstimos interlinguísticos.

- Conforme já apresentado anteriormente, a língua de sinais permite ao surdo conversar e refletir sobre qualquer assunto. - o que supõe riqueza lexical (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 161).

GRAMÁTICA

- Gramática construída a partir de categorias da língua grega, sedimentada com léxico latino.

- Para completar a discussão sobre esse mito, cabe ressaltar que é muito comum as pessoas, equivocadamente, afirmarem que o empobre­cimento estrutural das línguas de sinais liga-se ao fato de que elas não apresentam, por exemplo, elementos de ligação, tais como preposições e conjunções. De acordo com Quadros e Karnopp (2004), essa caracte­rística não empobrece a língua de sinais, pois ela apresenta uma riqueza de expressividade diferente das línguas orais (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 163).

SEMÂNTICA

- Linguagem conotativa e denotativa.





- Presença de figuras de linguagem e pensamento.

- Mito: A língua de sinais é incapaz de expressar ideias abstratas, humor e sutilezas, como figuras de linguagem, estando ligada apenas a aspectos concretos (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 161).

- As línguas de sinais, como línguas visual-espaciais, apresen­tam elementos próprios, como expressão facial, expressão corpo­ral, movimento, velocidade e direção, que, incorporados ao sinal, garantem a mesma riqueza de expressão que as línguas orais (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 163).



2 REFLEXÃO


A seguir apresentamos uma reflexão a partir de questões sugeridas na disciplina Língua Brasileira de Sinais - Licenciatura Letras Português/Inglês, Claretiano, 2017.


2.1 Para o ouvinte, ao aprender Libras, qual aspecto você julga ser mais difícil: os sinais manuais ou os não manuais, como por exemplo, a interrogação e a negação?

Nosso ponto de vista é que para aprendiz ouvinte é mais difícil articular de forma simultânea os aspectos não manuais da Libras. Este gestual requer uma sincronia com o conteúdo da mensagem, uma vez que os elementos mímicos são processados de forma simultânea (QUADROS; KARNOPP, 2004 apud PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 166). Esta habilidade nos parece mais difícil de ser apreendida pelo aprendiz ouvinte de libras porque ela não depende da articulação fonadora a partir da percepção sonora, mas sim da articulação de expressões facial e corporal articuladas ao sentido da mensagem e aos demais elementos que compõem a comunicação da linguagem de sinais.


2.2 E em relação à aquisição de uma língua e o desenvolvimento da linguagem, complemente seu texto, abordando a importância da Língua de Sinais para o desenvolvimento linguístico, cognitivo e afetivo da criança surda.

Segundo Pedroso e Rocha (2013, p. 157), “[...] as línguas de sinais expressam conceitos abstratos. Sabe-se, hoje, que é possível discutir qualquer assunto em língua de sinais: política, econo­mia, matemática, física, psicologia, poesia ou literatura, por exemplo”. Este alcance semântico e comunicacional da língua de sinais permite que o aprendiz surdo possa desenvolver as habilidades cognitivas decorrentes do aprendizado de uma língua. Poder discorrer sobre os mais diversos assuntos em um idioma é uma habilidade que denota o acesso efetivo aos conteúdos dos assuntos em questão. A capacidade comunicativa da língua de sinais se equipara, assim, a quaisquer outras línguas.

Segundo Pedroso e Rocha (2013, p. 158), “A soletração manual não é uma língua distinta, mas um simples código baseado nas línguas orais. Assim, nenhum surdo se utiliza apenas da soletração para se comunicar”. O aprendiz surdo necessita de um aparato variado e diversificado que vai além das tentativas da língua oral para fazer o surdo “falar”. A habilidade de comunicação do indivíduo surdo pode até conter minimamente com a soletração manual, mas sem o arcabouço de outras unidades mínimas da língua de sinais, este indivíduo não conseguiria se comunicar a partir de sua condição.


2.3 É importante que os ouvintes também aprendam Libras?

Segundo Quadros e Karnopp (2004 apud PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 157), “[...] apenas 30% dos sinais têm significados identificáveis com a forma do sinal, ou seja, são icônicos. Portanto, os demais 70% não podem ser reconhecidos na sua repre­sentação, o que mostra a necessidade de que essa língua seja, de fato, aprendida pelos ouvintes”. Neste sentido, percebemos que se o ouvinte quiser se comunicar com o surdo, aquele precisará usar a língua de sinais.

O ouvinte não pode pressupor que a língua falada é superior ou mais complexa, e por isto mais apta, que a língua de sinais. Ambas possuem gramáticas e complexidade próprias. Seria “[...] um equívoco considerar que as línguas de sinais são subordina­das às línguas faladas (PEDROSO; ROCHA, 2013, p. 159)”.

Para os indivíduos que falam línguas diferentes, a experiência de aprender a se comunicar na língua do outro é garantia não só de aprender uma nova forma de ver o mundo, mas também uma nova forma de se manifestar no mundo e de enriquecer a própria forma de uso e comunicação em sua língua materna.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

PEDROSO, Cristina Cinto Araújo; ROCHA, Juliana Cardoso de Melo. Língua brasileira de sinais. Batatais: Claretiano, 2013.




[1] Adriano Lima, São José dos Campos, 2017.

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